quarta-feira, 10 de junho de 2009

Abuso de Autoridade na USP

Em solidariedade aos estudantes da USP, encaminho mensagem que me foi enviada pela colega Gabriela Rocha, da Faculdade Cásper Líbero:

Relato do prof. dr. Paulo Ortellado, da USP, enviado ao meio-dia de hoje, 10/6: Prezados colegas,

Hoje, as associações de funcionários, estudantes e professoreshaviam deliberado por uma manifestação em frente à reitoria. Amanifestação, que eu presenciei, foi completamente pacífica.Depois, as organizações de funcionários e estudantes saíram empasseata para o portão 1 para repudiar a presença da polícia docampus. Embora a Adusp não tivesse aderido a essa manifestação,eu, individualmente, a acompanhei para presenciar os fatos que, aessa altura, já se anunciavam.

Os estudantes e funcionárioschegaram ao portão 1 e ficaram cara a cara com os policiaismilitares, na altura da avenida Alvarenga. Houve as palavras de ordemusuais dos sindicatos contra a presença da polícia e xingamentosmais ou menos espontâneos por parte dos manifestantes. Estimo cercade 1200 pessoas nesta manifestação. Nesta altura, saí da manifestação, porque se iniciavaassembléia dos docentes da USP que seria realizada no prédio daHistória/ Geografia. No decorrer da assembléia, chegaram relatosque a tropa de choque havia agredido os estudantes e funcionários eque se iniciava um tumulto de grandes proporções. A assembléia foisuspensa e saímos para o estacionamento e descemos as escadas quedão para a avenida Luciano Gualberto para ver o que estavaacontecendo. Quando chegamos na altura do gramado, havia umamultidão de centenas de pessoas, a maioria estudantes correndo e atropa de choque avançando e lançando bombas de concusão(falsamente chamadas de “efeito moral” porque soltam estilhaçose machucam bastante) e de gás lacrimogêneo. A multidão subiucorrendo até o prédio da História/ Geografia, onde a assembléiahavia sido interrompida e começou a chover bombas no estacionamentoe entrada do prédio (mais ou menos em frente à lanchonete e entradadas rampas). Sentimos um cheiro forte de gás lacrimogêneo e dezenasde nossos colegas começaram a passar mal devido aos efeitos do gás– lembro da professora Graziela, do professor Thomás, do professorAlessandro Soares, do professor Cogiolla, do professor Jorge Machadoe da professora Lizete todos com os olhos inchados e vermelhos e tontospelo efeito do gás. A multidão de cerca de 400 ou 500 pessoas ficou acuada neste edifício cercada pela polícia e 4 helicópteros.

Oclima era de pânico. Durante cerca de uma hora, pelo menos, se ouviua explosão de bombas e o cheiro de gás invadia o prédio. Depois deuma tensão que parecia infinita, recebemos notícia que um pequenogrupo havia conseguido conversar com o chefe da tropa e persuadido derecuar. Neste momento, também, os estudantes no meio de um grandetumulto haviam conseguido fazer uma pequena assembléia de umas 200pessoas (todas as outras dispersas e em pânico) e deliberado desceraté o gramado (para fazer uma assembléia mais organizada).

Neste momento, recebi notícia que meu colega Thomás Haddad havia descidoaté a reitoria para pedir bom senso ao chefe da tropa e foi recebido com gás de pimenta e passava muito mal. Ele estava na sede da Aduspse recuperando. Durante a espera infinita no pátio da História, os relatos deagressões se multiplicavam. Escutei que a diretoria do Sintusp foipresa de maneira completamente arbitrária e vi vários estudantesque haviam sido espancados ou se machucado com as bombas de concusão (inclusive meu colega, professor Jorge Machado). Escutei relato de pelo menos três professores que tentaram mediar o conflito e foram agredidos. Na sede da Adusp, soube, por meio do relato de umaprofessora da TO que chegou cedo ao hospital que pelo menos doisestudantes e um funcionário haviam sido feridos. Dois colegassubiram lá agora há pouco (por volta das 7 e meia) e tiveram aentrada barrada – os seguranças não deixavam ninguém entrar enenhum funcionário podia dar qualquer informação. Uma outradelegação de professores foi ao 93o DP para ver quantas pessoashaviam sido presas.

A informação incompleta que recebo até agoraé que dois funcion� �rios do Sintusp foram presos – mas escuteirelatos de primeira pessoa de que haveria mais presos. A situação, agora, é de aparente tranquilidade. Há uma assembléia de professores que se reuniu novamente na História eestou indo para lá. A situação é gravíssima. Hoje me envergonhoda nossa universidade ser dirigida por uma reitora que, alertada dosriscos (eu mesmo a alertei em reunião na última sexta-feira) ,autorizou que essa barbárie acontecesse num campus universitário.Estou cercado de colegas que estão chocados com a omissão dareitora. Na minha opinião, se a comunidade acadêmica não semobilizar diante desses fatos gravíssimos, que atentam contra odiálogo, o bom senso e a liberdade de pensamento e ação, não seimais. Por favor, se acharem necessário, reenviem esse relato a quemjulgarem que é conveniente.

Cordialmente, Prof. Dr. Pablo Ortella da Escola de Artes, Ciências e Humanidades Universidade de São Paulo

domingo, 26 de abril de 2009

Crise econômica e aprofundamento da política neoliberal

Não sou o menos crítico do governo Lula e muito menos o mais crítico do governo. Assim como no governo FHC eu não achava tudo maravilhoso, também não acho tudo uma desgraça no governo Lula.

O que me incomoda é o discurso ingênuo ou demagógico (acredito que seja demagógico) do presidente que está, por um lado, se gabando de ter efetivado todas as condições que o FMI impôs ao Brasil (iniciado no governo FHC com as privatizações) e, de outro lado, criticando os EUA e o FMI que não souberam fazer a lição de casa e deixou a crise tomar proporções mundiais. Além disso, disse ainda que o FMI não soube acautelar os EUA, maior economia mundial, da II maior crise de sua história e que arrasta o mundo junto com ela.

Entretanto, o FMI conseguiu atingir os objetivos, ou quase todos, nos países de terceiro mundo: “Quando recorreram ao FMI e ao BM em busca de socorro urgente, o que receberam, em vez do alívio do endividamento, foi um grosso pacote de medidas de “reajuste estrutural”: cerca de 115 condições sine qua non para a ajuda financeira desregulamentação da economia e das finanças, a derrubada das barreiras alfandegárias e comerciais, a drástica redução dos gastos públicos e serviços sociais, a privatização das empresas estatais e a eliminação de garantias e direitos trabalhistas, inclusive com o enfraquecimento dos sindicatos, de modo a permitir demissões em massa e tornar o mercado de mão de obra mais barato, mais dócil, mais flexível[1]”.

Realmente o governo americano e alguns países como a Inglaterra foram negligentes quanto à expansão descontrolada do mercado imobiliário, ao permitir o subprime de financiamento do setor imobiliário sem garantias de que haveria o pagamento dessa dívida pelos hipotecários às instituições financeiras, soma-se a isso, a bolha imobiliária americana, ou seja, os preços praticados são muito mais altos que o valor real dos imóveis.

A partir do momento em que não há o pagamento em massa aos credores começa a haver uma desconfiança exagerada, as instituições financeiras ficam receosas em oferecer crédito e dessa forma, a economia fica paralisada, pois, sem capital de giro as empresas não tem como produzir e sem produção ocorrem demissões de trabalhadores e o consumo de produtos despenca. Daí, estamos diante da recessão ou depressão, os economistas não chegaram a um consenso.

Essa, segundo especialistas em economia, é a maior crise depois quebra da bolsa de Nova York e depressão de 1929. Isso porque afetou a confiança e quebrou empresas no mundo todo, causando desemprego em massa nos países em que ela se instalou, na medida em que, num momento de recessão, retira o investimento em países estrangeiros para saldar eventuais dívidas com seus credores.

O FMI tem uma nova função agora, a de garantir o aprofundamento das medidas neoliberais globalizantes para manter o domínio do império americano. Esse novo objetivo se concretizou com a declaração[2] do G-20 sobre os mercados financeiros e a economia, reafirmando a política neoliberal nos seus países. Pior que isso, com o Brasil na presidência do G-20, ou seja, debaixo de nossos próprios olhos.

G-20 de 4 para o FMI e o Banco Mundial
Os chefes de Estado e Governo dos vinte países de maior economia mundial, o secretário geral das Nações Unidas, o diretor geral do FMI e os presidentes do Banco Mundial, a Comissão Européia e o Foro de Estabilidade Financieira, se reuniram em Washington, no dia 15 de novembro de 2008. Nessa reunião, se curvaram ao FMI e ao BM, assinando uma declaração para aprofundar a globalização através de medidas que assegurem a compatibilidade com um sistema financeiro moderno e crescentemente globalizado, através de medidas de curto (até 31 de março de 2009) e médio prazo. O ítem 12 da declaração é o mais esclarecedor quanto às intenções do G-20 frente ao FMI:

“Compromiso con una Economía Global Abierta: 12. Reconocemos que estas reformas únicamente tendrán el éxito si están firmemente fundamentadas sobre un firme compromiso con los principios del libre mercado, incluyendo el império de la ley, el respeto por la propiedad privada, el comercio y las inversiones libres en los mercados competitivos y se apoyan sobre unos sistemas financieros eficientes y eficazmente regulados. Estos principios son esenciales para el crecimiento económico y la prosperidad, habiendo ya liberado a millones de personas de la pobreza y elevado sustancialmente el nivel de vida a escala global. Reconociendo la necesidad de mejorar la regulación del sector financiero, deberemos, sin embargo, evitar un exceso de regulación que podría obstaculizar el crecimiento económico y exacerbar la contracción de los flujos de capital, incluyendo a los países en desarrollo.”
Os países da União Européia têm condições de negociar os juros e as exigências para o financiamento de dívidas em pé de igualdade com o FMI devido à força do bloco econômico europeu, mas e os países do Terceiro Mundo como o Brasil tem o mesmo poder de negociação?
Apesar do discurso do Governo Federal contra o papel do FMI no mundo, o governo assinou declaração em que afirma: “Subrayamos el papel importante que corresponde al Fondo Monetario Internacional (FMI) en la respuesta a la crisis, nos complacen sus nuevas facilidades de liquidez a corto plazo e instamos la revisión ya en curso de sus instrumentos y servicios para garantizar la flexibilidad;”

A chamada flexibilidade faz parte do reajuste estrutural com a eliminação dos direitos e garantias trabalhistas e o enfraquecimento dos sindicatos. A tentativa de por fim ao imposto sindical foi uma tentava de enfraquecer os sindicatos. Novas pressões para flexibilizar os direitos do trabalhador brasileiro vêm por aí. Pelo visto, ao continuar nesse viés neoliberal vamos continuar de 4 com a caneca na mão pedindo esmola ao FMI e ao BM. Manda quem pode, obedece quem não tem juízo.

Esmola para os países de Terceiro Mundo
Na declaração em que propõem amplas medidas de aprofundamento do sistema neoliberal, sugere também a reformulação do FMI a médio prazo com o ingresso de membros de países subdesenvolvidos no Fundo: “Pusimos de relieve que las Instituciones de Bretton Woods debían reformarse de manera exhaustiva para que puedan reflejar de forma más adecuada los pesos económicos cambiantes em la economía internacional y ser más responsables de los retos futuros. Las economías emergentes y en desarrollo deberán tener más voz y representación en dichas instituciones.”

Apesar de ser uma proposta positiva, que favorece os países subdesenvolvidos, foi pequeno o avanço em relação às medidas que o G-20 se propôs a efetivar para manter a política neoliberal em seus países. Dominique Strauss-Kahn, Director Gerente do FMI, agradece: "’Es motivo de gran satisfacción que los dirigentes del G-20 hayan respaldado firmemente la importante función del FMI en la gestión de las crisis y la reforma de la arquitectura financiera internacional’, manifestó Strauss-Kahn. ‘Además de ayudar a algunos países miembros que están enfrentando circunstancias difíciles mediante un apoyo rápido y eficaz, creamos un servicio de liquidez a corto plazo y continuamos reviendo nuestros instrumentos y servicios financieros.’"[3]
Uma medida não tão neoliberal

A declaração também deliberou para uma regulamentação maior do mercado financeiro com medidas que tornem ele mais transparente e ao mesmo tempo responsável. Essa medida não agrada tanto assim o mercado, que agiu até aqui com mínima intervenção do Estado e vê agora o mesmo interferir na galinha dos ovos de ouro.

Remédio ou veneno contra o câncer neoliberal
Os efeitos negativos do neoliberalismo e da globalização estão aí para quem quiser ver. Há duas explicações para o comportamento e comprometimento do Governo Federal com o FMI: 1ª.) ele acredita que a saída para a crise é aprofundar esse sistema neoliberal ou 2ª.) acredita na tática suicida de quanto mais rápido o sistema neoliberal entrar em colapso melhor para a mudança desse sistema perverso.

Quem não te conhece que te compre
A perversidade e o cinismo do FMI chegam a ponto de advertir em artigo postado no site que “o avanço contra a pobreza está em perigo” com a desaceleração das economias mundiais fruto da crise financeira:

“El FMI advirtió que los avances en contra de la pobreza logrados por países de bajo ingreso de todas las regiones están en peligro como consecuencia de la profunda desaceleración de la economía mundial, fruto de la crisis financiera.

‘La crisis financiera más grave de las últimas generaciones ha empujado muchas economias avanzadas a la recesión. Por razones que les son ajenas, los países en desarrollo enfrentan serias dificultades en medio de la creciente escasez de crédito y el enfriamiento del comercio internacional’, declaró ante una conferencia de las Naciones Unidas el Subdirector Gerente del FMI Murilo Portugal.

‘Los avances recientes contra la pobreza y las mejoras del nivel de vida se encuentran en peligro, especialmente en los países de bajo ingreso’, manifestó Portugal el 1 de diciembre en su intervención ante la Conferencia de las Naciones Unidas sobre la Financiación para el Desarrollo, celebrada en Doha, Qatar[4].”

Murilo Portugal, subgerente do FMI, se refere à crise mundial como se o Fundo não tivesse responsabilidade sobre ela, como se a globalização não tivesse efeitos negativos sobre a economia, ou seja, a culpa é da desaceleração da economia e não da globalização e as medidas que os países tomaram para favorecer os interesses capitalistas americanos e do primeiro mundo.

O artigo refere-se à pobreza como se o pacote neoliberal fosse criado para resolvê-la e não para garantir lucros cada vez maiores às empresas norte-americanas e aos governos de países desenvolvidos, como se não tivesse sido criado como forma de dominação, de um neocolonialismo sobre os países de Terceiro Mundo.

O balanço do encontro é o aprofundamento das contradições geradas pelo neoliberalismo e pela globalização econômica financeira. O capitalismo vive ciclos de crise e crescimento e esta não é a primeira crise pós-reajuste estrutural, tivemos a crise da Ásia, Argentina, China, e outras, mas certamente esta crise americana é a pior, pois é a crise da maior potencia econômica mundial, se alastrando por todo o planeta com efeito dominó. Essas medidas que visam o aprofundamento do modelo econômico americano irão aprofundar as contradições do sistema e a próxima crise pode levar todo mundo para o buraco. O G-20 está pagando para ver. Façam suas apostas!

Perdemos a oportunidade histórica de negociar novas formas de socializar os ganhos e dividir poder das instituições financeiras internacionais, bem como reduzir a desigualdade entre os hemisférios norte e sul, instituindo um fundo para diminuir a pobreza e a desigualdade no mundo com parte dos lucros do FMI e Banco Mundial. Mais uma vez nos submetemos a globalização neoliberal para socializar as perdas, mas os lucros são privados. O FMI e o BM não precisaram se esforçar para aprofundar as desigualdades em curso entre o hemisfério norte e sul e dentro dos países subdesenvolvidos.


[1] SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: No loop da montanha-russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2002 (p. 53).

[2] Declaração do G-20: sítio: http://www.ue2008.fr/PFUE/lang/es/accueil/PFUE-11_2008/PFUE-16.11.2008/declaration_du_sommet_sur_les_marches_financiers_et_l_economie_mondiale
[3] Comunicado do FMI em 15/11/08: El Director Gerente del FMI, Dominique Strauss-Kahn, describe el plan de acción del G-20 como un paso significativo hacia el estrechamiento de la cooperación internacional. Sítio: http://www.imf.org/external/spanish/np/sec/pr/2008/pr08286s.htm
[4] Boletim do FMI em 03/12/2008. Sítio - http://www.imf.org/external/spanish/index.htm
JORNALISMO: MITO E RAZÃO
por Mario Malina



Mito, razão e filosofia são termos intimamente ligados. O Mito e a razão como definição de filosofia foram considerados antagônicos por autores como Burnet. Nesse sentido, a filosofia surgia como a explicação do mundo pela razão. Contudo, autores como Conford consideravam que na razão da filosofia estava contido o mito, mostrando que os fundamentos de muitos mitos estavam presentes nos primeiros filósofos. Se entendermos desta forma, razão filosófica e mito podem ser considerados e comparados a duas faces de uma mesma moeda. Daí surgem algumas questões para a nossa realidade: se considerarmos o mito importante para a explicação da sociedade por que ele foi se perdendo ao longo do tempo? Como podemos recuperá-lo? O objetivo desse artigo não é dar respostas a essas perguntas, mas apontar e discutir essas questões para compreendermos melhor a sociedade na qual vivemos.

A palavra mito vem do grego mythos e significa fábula ou narrativa. O jornalismo está intrinsecamente vinculado à idéia de mito e razão. O jornalismo utiliza a razão e a narrativa para criação das suas reportagens. E o jornalista quando faz uma reportagem conta uma história por meio da narrativa (mito), de forma racional. Dessa forma, podemos dizer que o jornalista é um filosofo do cotidiano.

Esse filósofo jornalista narra os fatos de forma racional, mas será que não nos tornamos racionais demais? Afinal sabemos que o racionalismo não tem condições de explicar tudo. Nossas questões espirituais são muito complexas e nem tudo pode ser explicado por palavras. Contudo, temos a mania de explicar tudo pela razão até mesmo o que é inexplicável. Daí a importância do mito. Segundo Marilena Chauí (2002, p. 36), “o mito conserva a realidade social dando-lhe um instrumento imaginário para conviver com suas contradições e dificuldades”.[1]

Joseph Campbell no livro “O poder do mito” destaca o caos dos jornais, preocupados com o imediatismo do cotidiano. Mas por trás de tantas histórias há também as suas explicações. Daí a importância da filosofia e do mito. Talvez os jornalistas pudessem não apenas contar histórias, mas nos ajudar a desvendar o que está por trás delas. Explicar o mito que foi criado pelas diversas tribos de jovens justamente pela falta de mito. Campbell explica:

“Eles os fabricam por sua própria conta. Por isso é que temos grafites por toda a cidade. Esses adolescentes têm suas próprias gangues, suas próprias iniciações, sua própria moralidade. Estão fazendo o melhor que podem. Mas são perigosos, porque suas leis não são as mesmas da cidade. Eles não foram iniciados na nossa sociedade.”[2]

O mito, por outro lado, pode ter um viés negativo, pode servir para esconder a realidade e impedir transformações importantes para uma sociedade. Um mito que justifica e nega a realidade por ele criada faz com que a sociedade não enxergue a verdade que a rodeia e não tem como analisá-la de forma correta. Dessa forma, a sociedade diagnostica a doença como sendo uma, quando na realidade é outra e o paciente não é curado, mas apenas anestesiado pelos remédios. Chauí explica esse fenômeno:

“Muitos indagarão como o mito da não-violência brasileira pode persistir sob o impacto da violência real, cotidiana, conhecida de todos e que, nos últimos tempos, é também ampliada por sua divulgação e difusão pelos meios de comunicação de massa. Ora, é justamente no modo de interpretação da violência que o mito encontra meios para conservar-se.”[3]

Daí a grande importância da imprensa que, muitas vezes, repete idéias e incentiva ou desmotiva ações que lhe interessam para sedimentar mitos e manter o status quo. Por isso, essa imprensa pode ser benéfica ou maléfica para a população. Daí a importância de uma diversidade de meios de comunicação que representem os vários segmentos da sociedade.

Atualmente, o imediatismo das notícias pode ficar por conta da Internet devido à sua velocidade de publicação que é maior que dos jornais. E os jornais podem cumprir um novo papel, o de investigar o cotidiano, o que se esconde nas histórias das pessoas. Procurar entender o espírito das pessoas através dos dramas pessoais.

Portanto, o jornalismo tem condições de entender os fatos através da razão e do mito sem que isso signifique dar a opinião sobre fatos, mas interpretá-los ou mostrar seus desdobramentos para que o leitor tenha condições de interpretá-los. Afinal seria mais honesto com os próprios jornalistas e com a sociedade se enterrássemos a pretensa “isenção jornalística” em nome da interpretação dos fatos. Dessa forma, o jornalismo, com uma visão mais ampla da sociedade, contribuiria para sua classe profissional e para o melhor entendimento das pessoas em relação ao mundo.









OBRAS CONSULTADAS



1 CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume 1. 2ª. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

2 CAMPBELL, Joseph. O poder do mito. 15ª. ed. São Paulo: Palas Athena, 1997.

3 PLATÃO. Apologia de Sócrates. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2007.

4 CHAUÍ, Marilena. Contra a violência. Ciranda internacional de informação independente, abril 2007. (30/03/08).



[1] Marilena Chauí, Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume 1, 2002, p. 36.

[2]Joseph Campbell, O poder do mito, 1997.

[3] Marilena Chauí, Contra a violência, abr. 2007.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Tropa de elite ou de intolerância?

Li diversas críticas a respeito do filme, depois fui assisti-lo e refleti a respeito dele. Acredito que a imprensa criou uma falsa polêmica a respeito do tema. Muitos criticam o filme porque ele justifica a tortura para alcançar o objetivo principal, ou seja, chegar até o traficante. Dessa forma, podemos dizer que vale o ditado de que os fins justificam os meios, ainda que eles sejam ilícitos, como a tortura por exemplo.

Estamos voltando à Antigüidade romana onde havia o olho por olho, dente por dente. Se alguém mata um policial, a corporação se encarrega de vingar-se e matar aquele que cometeu tal ato. A população, diante do caos e da impunidade, se sente legitimada a fazer justiça com as próprias mãos.

A população está revoltada e cansada de tanta violência, e com razão. Está cansada de traficantes sem escrúpulos e com a corrupção de parte da polícia que tudo pode, que tudo justifica. Estamos radicalizando os diversos núcleos que há na sociedade. Perdemos o controle e ainda temos uma política de controle social, assim, a equação só pode ser mortes a níveis de guerra civil.

O filme tem uma particularidade, que não se trata de mostrar o lado da polícia, mas de uma polícia “especializada”, o BOPE (tropa de elite). Essa polícia é intolerante com seus próprios integrantes e, por conseqüência, externa isso para a sociedade onde atua, ou seja, é intolerante com a sociedade. E nesse lugar onde moramos, há policiais corruptos, traficantes, consumidores de drogas ilícitas e pessoas comuns. Nenhuma delas está isolada, todas elas interagindo, e não há como separar o tráfico e a comunidade onde vive, pois, há uma ligação de cumplicidade, de proteção e ajuda financeira aos mais necessitados.

Na realidade o próprio protagonista, Capitão Nascimento (Wagner Moura), sabe que o sistema não funciona, que é uma guerra sem fim e quer sair da Tropa. O diretor mostra o filme sob a ótica do policial da tropa de elite, exclusivamente. Esse talvez seja o grande demérito do filme, pois, não há apenas o lado do policial, ou o lado do traficante, ou ainda, o lado do consumidor, mas sobretudo das pessoas inocentes que acabam pagando pela violência, com balas perdidas e tortura cotidiana.

Outro ponto a se questionar é porque o governo cria uma elite de policiais intolerantes, que naturalmente irá entrar em choque com uma polícia corrupta, criando um conflito dentro da própria policia. Quando o mais lógico e de bom senso seria substituir, gradualmente, uma polícia ineficiente por outra mais eficiente e, junto a isso, uma política de urbanização de favelas e desenvolvimento social.

Talvez devêssemos começar a refletir mais, debater mais sobre o tema da violência. Para mim esse é o grande valor do filme. Afinal que tipo de sociedade nós estamos criando?

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Capitalismo e Meio Ambiente

Atualmente, é impossível imaginar uma educação que não tenha o meio ambiente como tema. Assim como não podemos deixar de discutir o meio ambiente sem questionar o sistema capitalista, ou ainda, o crescimento econômico. Somando esses dois fatores chegamos a equação do tão falado desenvolvimento sustentável.Como você pode ter um meio ambiente menos poluído, diminuir o aquecimento global e diminuir a camada de ozônio com uma cultura que prima pelo consumismo descontrolado?

Apesar de haver uma conscientização das pessoas em relação ao meio ambiente, elas continuam consumindo. Significa dizer que uma cultura de sociedade de consumo não se desconstrói do dia para noite.Por outro lado, as empresas e os governos preocupados com a própria imagem começaram a se mecher há algum tempo. E no dia 16 de setembro ocorreu o 20º aniversário da assinatura do Protocolo de Montreal — acordo internacional pioneiro que deteve e, eventualmente, reverteu o processo de redução da camada de ozônio, lançando uma nova era de responsabilidade ambiental.

O Protocolo foi bem sucedido e os 191 países signatários eliminaram, conjuntamente, mais de 95% das substâncias que destroem a camada de ozônio, e a expectativa é que, até 2075, a camada de ozônio que protege a Terra retome seus níveis anteriores à década de 80.

Por isso, ambientalistas estão animados, pois, acreditam que o aquecimento global também pode ser revertido com o cumprimento dos ODM – Objetivos para o Desenvolvimento Mundial, dentre eles o de garantir a sustentabilidade ambiental.